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Maya Falks entrevista Jean Carbonera

Atualizado: 22 de mai. de 2019

A profissional de comunicação social, escritora e ativista Márcia Bastian Falkenbach, álias Maya Falks, entrevistou o advogado criminalista e fundador da organização Advogados Sem Fronteiras em uma matéria de Jornalismo para o Centro Universitário da FSG, de Caxias do Sul, RS.


Na foto, Jean Carbonera e Maya Falks no lançamento do primeiro livro da escritora, Depois de Tudo, de 2015. (Fotógrafa Marlei Ferreira)


Apaixonado pela defesa dos mais vulneráveis, o advogado criminalista Jean Carbonera trouxe a Caxias do Sul uma das entidades de Direitos Humanos mais respeitadas do mundo.

Jean Carbonera se aventurou pelo mundo. Formado em direito, viajou a Europa em defesa dos direitos humanos e finalizou sua formação em Cooperação Internacional e Políticas de Direitos Humanos nos mesmos lugares onde atuou junto à Anistia Internacional e conheceu a ONG Advogados Sem Fronteiras, a qual trouxe para o Brasil e a implantou em seu país natal com base na cidade de Caxias do Sul.


Criminalista por excelência, Jean se divide entre seu escritório particular e as causas que defende, tendo passado recentemente pelo Seminário sobre Defesa Criminal Internacional no Campus das Nações Unidas de Turim, organizado pela United Nations Interregional Crime and Justice Research Institute e o Conselho de Defesa do Tribunal Penal Internacional.


Atualmente, devido à necessidade de troca de gestão da ASF Brasil, Jean se tornou Presidente de Honra a pedidos da nova gestão, encabeçada pela advogada Débora Pinter Moreira, devido ao seu trabalho fundamental na consolidação da entidade não apenas no Brasil, mas em toda a América Latina.


Com o objetivo de trabalhar a temática dos direitos humanos, conversamos com Jean mesclando as questões sociais e suas experiências profissionais.


Maya Falks: Quando você optou pelo curso de direito, já havia um interesse em trabalhar em causas humanitárias e direitos humanos?

Jean Carbonera: A defesa das pessoas em condição de vulnerabilidade sempre foi algo que me inspirou. Não havia um interesse específico pela atuação profissional em causas humanitárias, mas, sendo os chamados direitos humanos a base dos direitos fundamentais de todas as pessoas, não teria como dissociar.


MF: Como começou seu interesse por direitos humanos?

JC: Não teve um momento definido. Desde criança, sempre me indignei com as injustiças. Na minha atividade profissional, a atuação se deu naturalmente, pelo meu envolvimento prévio com diversas causas sociais e combate às discriminações.


MF: Você morou na Europa um tempo e foi lá que você se envolveu com a ONG Advogados sem Fronteiras, certo? Como foi essa aproximação?

JC: Eu era membro da Anistia Internacional e coordenava uma rede internacional de ONGs e obras sociais, com sede na Bélgica, além de ser advogado e ter feito mestrado na área de cooperação internacional e direito na Itália. Meu primeiro contato com a ASF foi quando ainda estava no Brasil, através do Fórum Social Mundial e da internet. Na Europa, tive a oportunidade de conversar pessoalmente com os dirigentes de ASFs da Bélgica, Países Baixos e França, quando fui convidado para auxiliar na organização e lançamento da Rede Internacional Advogados Sem Fronteiras, incluindo o Brasil nesse movimento.


MF: Você fundou a ASF no Brasil, como foi a aceitação dos colegas no país?

JC: Foi muito bem recebida, embora muitos tivessem dificuldades para entender o trabalho desenvolvido pela organização, que geralmente leva auxílio a pessoas de outros países, com menor atuação em âmbito local, devido ao fato de o Brasil ter sido, por anos, um país que praticamente só recebia ajuda externa, não tinha protagonismo.


MF: Dentro da ONG, qual foi a causa que mais te marcou?

JC: Pessoalmente, foi a nossa intervenção no caso da camponesa cristã paquistanesa Asia Bibi, então condenada a morte por blasfêmia, num país de maioria muçulmana e leis bastante severas com cunho religioso. Asia Bibi foi salva da morte. Porém, para a segurança dela, o desfecho do caso é mantido sob sigilo.


MF: Qual é, atualmente, o maior obstáculo da aplicação dos direitos humanos na prática?

JC: A ignorância e o preconceito das pessoas.


MF: Você tem bastante atuação na questão carcerária diretamente nos presídios de Caxias do Sul, qual você considera o maior problema do sistema carcerário atualmente – o mais urgente a ser resolvido?

JC: Caxias do Sul tem, na prática, quatro casas prisionais: Penitenciária Estadual de Caxias do Sul (PECS/Apanhador), Presídio Regional de Caxias do Sul (PRCS/PICS), Instituto Penal de Caxias do Sul (IPCS/Albergue) e a ala feminina da PRCS. Presido o Conselho da Comunidade da região penitenciária de Caxias do Sul, que abrange as Comarcas de Antônio Prado, Farroupilha, Flores da Cunha, Nova Petrópolis, São Marcos e Caxias. O maior e mais urgente problema do sistema carcerário nacional é, há décadas e só aumentando, a superlotação. Quanto mais pessoas dentro da cadeia, maior será a multiplicação da criminalidade e a cooptação de pessoas pelo crime organizado.


MF: Ainda da questão carcerária, quais são os maiores mitos e mentiras que as pessoas acreditam sobre esse tema?

JC: Acharem que são todos iguais. As pessoas que estão presas têm histórias de vida e situações sociais diversas. Cometem crimes muito diferentes uns dos outros. Algumas possuem sonhos, outras remorsos e culpas, umas poucas, esperanças. O tratamento que a sociedade e o estado lhes dispensa é igualitariamente maléfico e ineficaz.


MF: Como você vê o futuro do Brasil nas questões de direitos humanos?

JC: Voltei para o país, em 2010, com muitas esperanças. A fundação da ASF aqui, como uma entidade formada por juristas brasileiros para levar o acesso à justiça e a proteção dos direitos humanos para fora das fronteiras – consciente que ainda existia muito a fazer internamente – era reflexo disso.

Porém, os últimos acontecimentos do país demonstram que a democracia e a organização social do país ainda é extremamente frágil e temos muitos anos de luta para que o país possa se orgulhar de como trata as questões relacionadas aos direitos humanos.


MF: Qual a maior urgência que o Brasil tem hoje sobre direitos humanos?

JC: É urgente garantirmos o acesso à informação de qualidade e sem parcialidades hipócritas e desleais. As redes sociais pareciam ser um meio democrático e eficaz para se atingir esse fim, mas o direcionamento de algoritmos e a criação de páginas e perfis falsos, com notícias fabricadas sob medida e viralizadas com uso de poder econômico, acabaram tirando muita credibilidade das informações por lá disseminadas. Os veículos de comunicação social tradicionais, que haviam perdido fôlego, demonstraram ser mais confiáveis quanto à veracidade dos fatos narrados. Não obstante, no Brasil, a concentração de grande poder midiático nas mãos de poucas famílias, que pertencem a uma elite econômica com linha ideológica clara, mas não publicamente assumida, e a falta de controle da sociedade sobre os meios de comunicação, permite que muitos acontecimentos sociais sejam direcionados de acordo com a vontade de quem detém esse poder. Ainda que a notícia seja verdadeira, a forma, a versão, o momento e a frequência como ela é mostrada fazem diferença. Se os maiores obstáculos à aplicação dos direitos humanos na prática são a ignorância e o preconceito, é urgente combatê-los, e garantir o acesso à informação honesta é um bom caminho para isso.


MF: Onde o Brasil melhorou em direitos humanos?

JC: Os direitos humanos passaram a ser mais debatidos. Seguindo uma tendência mundial, com o advento das redes sociais diversos assuntos passaram a ser discutidos de forma aberta e pública, permitindo a interação de qualquer pessoa e proporcionando conscientização em larga escala. Entre esses assuntos, todas as temáticas que implicam violações a direitos humanos, preconceitos e discriminação em geral.


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